02 agosto, 2010

Para o melhor amigo, o melhor pedaço...


 Serapião era um velho mendigo que perambulava pelas ruas da cidade.
Ao seu lado, o fiel escudeiro, um vira-lata branco e preto que atendia pelo nome de Malhado.
Serapião não pedia dinheiro.
Aceitava sempre um pão, uma banana, um pedaço de bolo ou outro alimento qualquer.
Quando suas roupas estavam imprestáveis, logo era socorrido por alguma alma caridosa.
Mudava a apresentação e era alvo de brincadeiras.
O mendigo era conhecido como um homem bom que perdera a razão, a família, os amigos e até a identidade.
Não tomava bebida alcoólica e estava sempre tranqüilo, mesmo quando não recebia comida alguma.
Dizia sempre que Deus lhe daria um pouco na hora certa e, sempre na hora que precisava, alguém lhe estendia uma porção de alimentos.
Serapião agradecia com reverência e rogava a Deus pela pessoa que o ajudava.
Tudo que ganhava, dava primeiro para o Malhado, que, paciente, comia e ficava esperando por mais um pouco.
Não tinham onde passar as noites.
Onde anoiteciam, lá dormiam.
Quando chovia, procuravam abrigo embaixo da ponte do ribeirão.
Ali o mendigo ficava a meditar, com um olhar perdido no horizonte.
Aquela figura era intrigante, pois levava uma vida vegetativa, sem progresso, sem esperança e sem um futuro promissor.
Certo dia, um homem, com a desculpa de lhe oferecer umas bananas, foi bater um papo com o velho mendigo.
Iniciou a conversa falando do Malhado, perguntou pela idade dele, mas Serapião não sabia.
Dizia não ter idéia, pois se encontraram certo dia, quando ambos perambulavam pelas ruas.
Nossa amizade começou com um pedaço de pão.
- Disse o mendigo.
Ele parecia estar faminto e eu lhe ofereci um pouco do meu almoço.
Ele agradeceu, abanando o rabo, e daí, não me largou mais.
Ele me ajuda muito e eu retribuo essa ajuda sempre que posso.
Como vocês se ajudam? Perguntou.
Ele me vigia quando estou dormindo.
Ninguém pode chegar perto que ele late e ataca.
Quando ele dorme, eu fico vigiando para que outro cachorro não o incomode.
Continuando a conversa, o homem lhe fez uma nova pergunta:
Serapião, você tem algum desejo de vida?
Sim, respondeu ele.
Tenho vontade de comer um cachorro-quente, daqueles que têm na lanchonete da esquina.
Só isso? Indagou.
É, no momento, é só isso que eu desejo.
Pois bem, disse-lhe o homem, vou satisfazer agora esse grande desejo.
Saiu, comprou um cachorro-quente e o entregou ao velho.
Ele arregalou os olhos, deu um sorriso, agradeceu a dádiva e, em seguida, tirou a salsicha, deu para o Malhado, e comeu o pão com os temperos.
O homem não entendeu aquele gesto, pois imaginava que a salsicha era o melhor pedaço.
Por que você deu para o Malhado, logo a salsicha? Interrogou, intrigado.
Ele, com a boca cheia, respondeu: Para o melhor amigo, o melhor pedaço.
E continuou comendo, alegre e satisfeito.
O homem se despediu de Serapião, passou a mão na cabeça do cão e saiu pensando com seus botões: Aprendi alguma coisa hoje.
Como é bom ter amigos.
Pessoas em que possamos confiar.
Por outro lado, é bom ser amigo de alguém e ter a satisfação de ser reconhecido como tal.
Jamais esquecerei a sabedoria deste mendigo.
E você, que parte tem reservado para os seus amigos?

O Céu e o Inferno...


Um homem, o seu cavalo e o seu cão iam por um caminho.
Quando passavam perto de uma árvore enorme, caiu um raio e os três morreram fulminados.
Mas o homem não se deu conta de que já tinha abandonado este mundo, e prosseguiu o seu caminho com os seus dois animais (às vezes os mortos andam um certo tempo antes de tomarem consciência da sua nova condição…).
O caminho era muito comprido e, colina acima, o Sol estava muito intenso; eles estavam suados e sedentos.
Numa curva do caminho viram um magnífico portal de mármore, que conduzia a uma praça pavimentada com portais de ouro.
O caminhante dirigiu-se ao homem que guardava a entrada e travou com ele, o seguinte diálogo:

- Bons dias.
- Bons dias – Respondeu o guardião.
- Como se chama este lugar tão bonito?
- Aqui é o céu.
- Que bom termos chegado ao Céu, porque estamos sedentos!
- Você pode entrar e beber quanta água queira. E o guardião apontou a fonte.
- Mas o meu cavalo e o meu cão também têm sede...
- Sinto muito – disse o guardião – mas aqui não é permitida a entrada de animais.

O homem levantou-se com grande desgosto, visto que tinha muitíssima sede, mas não pensava em beber sozinho.
Agradeceu ao guardião e seguiu adiante.
Depois de caminhar um bom pedaço de tempo encosta acima, já exaustos os três, chegaram a um outro sítio, cuja entrada estava assinalada por uma porta velha que dava para um caminho de terra ladeado por árvores...
À sombra de uma das árvores estava deitado um homem, com a cabeça tapada por um chapéu. Dormia, provavelmente.

- Bons dias – disse o caminhante.
- O homem respondeu com um aceno.
- Temos muita sede, o meu cavalo, o meu cão e eu.
- Há uma fonte no meio daquelas rochas – disse o homem apontando o lugar.
- Podeis beber toda a água que quiserdes.

O homem, o cavalo e o cão foram até à fonte e mataram a sua sede.
O caminhante voltou atrás, para agradecer ao homem.

- Podeis voltar sempre que quiserdes – respondeu este.
- A propósito, como se chama este lugar? – perguntou o caminhante.
- CÉU.
- O Céu? Mas, o guardião do portão de mármore disse-me que ali é que era o Céu!
- Ali não é o Céu, é o inferno – contradisse o guardião.

O caminhante ficou perplexo.

- Deverias proibir que utilizem o vosso nome!
Essa informação falsa deve provocar grandes confusões! – advertiu o caminhante.

- De modo nenhum! – respondeu o guardião – na realidade, fazem-nos um grande favor, porque ficam ali todos os que são capazes de abandonar os seus melhores amigos…

Paulo Coelho

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''Quem julgar as pessoas não tem tempo para amá-las.
A falta de amor é a maior de todas as pobrezas.''
Madre Tereza de Calcutá

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''Obrigado por ter dito algumas vezes o que eu realmente precisava ouvir,
 em vez do que eu queria que você dissesse,
e por ter me mostrado um outro lado a considerar.''
Silvia Schmidt

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''O Sábio Nunca Diz Tudo o Que Pensa, Mas Pensa Sempre Tudo Que Diz.''
Aristóteles

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''Um navio no porto é seguro, mas ele não foi feito para isso. ''
Almirante Grace Hopper

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''Cada idade tem a sua beleza essa beleza deve sempre ser uma liberdade.''
Robert Brasillach (escritor francês)